domingo, dezembro 30, 2007



Falar de reinserção social nesta altura do campeonato não é fácil . Mas hoje tivemos o nosso convidado especial para poder tentar esclarecer algumas coisas importantes no que diz respeito à integração: o estimado Zé “Prisas” Amaral que nunca se cansa de nos vir ver.
Vou armar-me em “jornalista” e fazer a entrevista possível.

- Então minha puta sabida, como é aquela merda lá fora?
- Olá a todos. (em off); Esta treta está a ser gravada?
- Achas? Ou já te esquecestes que temos limites no Projecto? Só o Professor Peciscas é que sabe fazer aquelas cenas, meu! Mas conta cá, como é que está a ser?
- Olha Bruno, quase que dava para fazer um guião para o La Féria ter mais um sucesso (risos). Existem muitos entraves e o receio das pessoas ao lidar com malta que vem dos EP’s tem muito que se lhe diga, como uma vez te contei. Por muito que se tente apregoar que o sistema funciona, é mentira. O melhor mesmo é não saberem de onde a gente vem. E desde que um tipo se porte da maneira normal que qualquer cidadão que nunca foi dentro, tudo fica melhor.
- Espera aí. Mas tu já tinhas muitas merdas organizadas… emprego, casa, alguns contactos se te sentisses atrapalhado…
- Eu sei. Mas a realidade é um pouco diferente. Sabes quantos anos aqui estive dentro?
- Quem faz as perguntas sou eu!
- Tá bem, meu! Foda-se mais o teu mau feitio… (rs)
- Como é que foi o teu primeiro dia?
- Um pouco lixado, pá. Tive que comprar roupas novas a umas gajas muito simpáticas numa enorme superfície que desconhecia, para não parecer um maltrapilho e arranjar a manutenção comestível para as primeiras impressões, tás a ver?
- Mau. Já te disse que as perguntas… (interrompido)
- Desculpa.
- De ajudas na Assistência, como é que estamos?
- Conforme. Tens os exemplos da Maria, do Miguel Horta, que nos acompanham por e-mail e vão tendo o conhecimento suficiente sobre o desenrolar da situação em lugares como o nosso, quase em regime de voluntariado, e também sabem que a RS estatal não funciona a todo o gás, mesmo que a gente lhes encha os bidões de óleo novo.
- Trabalho, ocupações, copos e gajas boas?
- Não me digas nada. É a melhor parte. A malta do trabalho é cinco estrelas e acho que gostam do que faço em prol da empresa. Dizem que sou desenvolto, ou desenrascado, já não me lembro. E quando calha vamos todos beber um copo e existe uma chavala que pode ser… mas respeitinho (olhos abertos como a delimitar território).
-?
- É. E muito importante: aprendam a não continuar a cometerem excessos quando vierem de saída. Há sempre uma altura para tudo. A reabilitação começa por nós próprios e os bacanos que aqui estão do lado de fora medem um gajo pelo comportamento diário. Atenção a isso. Têm que se deixar de certas cenas ao princípio até que a vida normalize. Depois, cada um conquistará o direito de fazer da vida dele o que quiser. Nunca voltar para aqui é uma norma sagrada, e tu sabes.
- O que é que tens no pensamento para dizer a todas as pessoas que nos acompanham por aqui e que, já li, têm-te em alta consideração?
- Em boa verdade, são momentos que nunca esqueceremos, Bruno. Eu só dava a “cara”. Mais não fazia do que transmitir o que muitos de nós pensamos e sentimos. Tomara que os continuem a acompanhar, juntamente com essa equipa de apoio informático do Palacete, e que a vontade do Director se mantenha. Acho que ganham todos e tu és capaz de continuar o que todos nós conseguimos.
Pela praxe, desejar um Ano Novo 2008 com muito Amor, saúde e dinheiro. Que são coisas que cá fora dão muito jeito.
- Zé, seu cabrão, dá cá um abraço…
-Bruno, sabes que estás na calha (apertado a mim), porta-te bem senão venho cá partir-te os cornos.

Bom Ano a todos!

Bruno Miguel Martins

segunda-feira, dezembro 24, 2007

Mensagem de Natal



Há quem passe o Natal em guerra, nos hospitais, em Vila Franca de Xira. Nós passamos o Natal na prisão, o que é que tem? Estamos a pagar um preço alto, nós sabemos. Mas a culpa é nossa.
Por isso, todos os natais, resolvemos fazer um balanço ao nosso processo penal e arranjar forma de minimizar o stress que esta quadra provoca fazendo teatro, espectáculos musicais, eventos desportivos, e uma pequena festa para os nossos filhos.

Por questões de segurança, desde a cimeira UE/África e a assinatura do Tratado de Lisboa estivemos sem sistema. Daí o não poder tido relatado todos os preparativos onde quase todos se disponibilizam na contribuição voluntária dos mesmos. E como era sobejamente chato estar aqui a fazer um rol de tretas, transcrevemos a mensagem de Natal que o nosso companheiro Zé “Prisas” Amaral deixou quando ontem nos visitou. (o gajo ainda não tem pilim para comprar um pc)

Bruno Miguel Martins



“Caríssimos Amigos,
o facto de me sentir integrado de novo na sociedade livre, não impede que me esqueça da atenção que sempre nos dispensaram e peço para que possam continuar, pois é um estímulo que a malta que aqui pernoita não se pode dar ao luxo de abdicar. Foram-me entregue inúmeras mensagens que guardo quase religiosamente. Talvez veja nelas um talismã que me ajudará a sentir-me um homem novo com uma nova vida. Fico-vos eternamente grato.

A vós, companheiros de infortúnio, nesta coisa nova de viver fora das celas e acordar de janelas e portas abertas, sinto que perdi ou me falta qualquer coisa. E no Natal, vocês sabem, a coisa tinha uma importância especial. Parece que me falta ouvir o roncar de alguns, um “empresta-me um cigarro”, uma caralhada ouvida a meio da noite.

Mesmo não trocando de ambiente, as nossas amizades continuarão. Mais: continuarei a mexer cá fora uns cordelinhos para que alguma malta possa ter nova oportunidade. Depois, saibam aproveitá-la.

Um bom e feliz Natal a todos com amizade,

Zé Pedro Amaral

sexta-feira, dezembro 07, 2007

Do alto do Marquês



“Perdemos” o nosso estimado companheiro destas andanças – o Zé Amaral – mas, depois dumas afinações estruturais no que toca ao regime interno numa reunião que tivemos esta semana, temos condições para continuar com este projecto. O “vício” da escrita com que ele nos contagiou leva-nos a pensar que poderá, esta também, ser mais uma forma de ajuda na reabilitação do que começou por ser uma experiência piloto.

Por estranho que possa parecer, pois a maior parte dos que aqui estão quase não gosta de ninguém, nutrimos pelo Zé um especial carinho e sempre nos interrogámos “o que é que este gajo está aqui a fazer?”. Nunca soubemos dar resposta.
Por isso, enquanto pudermos, vamos continuar a relatar o que conseguimos dizer, imitando-lhe o estilo e o trato. Recuperar o diálogo que mantínhamos pela leitura de cenas destas (blogues), que temos linkados ali ao lado, que muito gozo e aprendizagem nos deu e continua a dar.
Mais importante ainda, é o termos arranjado forma de o bacano do Zé continuar com a malta. Do lado de fora, claro. Porque enquanto não tiver um computador, só o vemos aos domingos. É visita certa.

Alguma palavra que lhe queiram deixar… o e-mail é o mesmo.


Os nossos melhores cumprimentos,

Bruno Miguel Martins – Núcleo Duro