Testemunhos (4)
Ao contrário das pessoas que têm uma vida normal, no Palacete vive-se uma vida diferente como facilmente se consegue supor. Tal como as diferentes vidas que cada um de nós tem para contar. No caso presente, é mais um testemunho de um imberbe que foi agarrado nas malhas da lei, faz alguns anos. Puto ainda novo, já com cadastro qualificado após determinado tempo, soletra entre raivas e impropérios a sua própria estória de menino.
“Nasci numa casa de putas e nunca me foi dado conhecer a minha origem paternal. Servia como isco nas saídas nocturnas das Princesas – como naquele tempo as chamavam - e ver as montras para angariar cabritos. Sempre rendia mais umas guloseimas com que me presenteavam, e uns passeios nos Montes Claros onde era sintomática a prostituição que não doía.
Comecei cedo a gostar de ganhar dinheiro. Sete, oito anos, e qualquer nota de cem paus fazia de mim um puto rico. Aliás, putos ricos, já que partilhava todos os ganhos com a malta da minha rua (Luciano Cordeiro).
Acabei por não ter juízo. Perdi a cabeça aos dezoito e dei um tiro num gajo que maltratou uma das gajas que me estimava.
Depois, perdido por completo, comecei por conquistar o meu próprio "cartel" e nunca mais ninguém se intrometeu na protecção que dava às iniciadas da mais velha profissão do mundo. Virei xulo, e ganhei caparro e respeito. Certo ou errado, era a minha vida.
Hoje já não sei onde elas andam. Nem tão pouco sei se ainda existe o mesmo esquema.
Não fosse este Zé que me acompanha desde algum tempo, não me faltaria apenas duas semanas para me ir embora com a promessa que irei mudar de vida. Palavra lhe foi dada.”
Papa Grelos, condenado a oito anos sem agravantes.
(Os impropérios e raivas foram excluídos ,mas fez questão de não retirar o último parágrafo do testemunho. Claro que não vou mentir ao dizer que me sinto bem com a palavra dada por ele. Desejo-te toda a sorte do mundo, Papa.)
3 Comments:
Papa Grelos(suponho que sejas vegetariano :)) boa sorte!
Zé o teu blog já me fascina há algum tempo não só pela beleza da tua escrita mas também pelas emoções que deixas transparecer nas tuas palavras.
És um importante elemento de ligação entre duas realidades separadas por grades de aço que consegues derreter com o teu blog, enriquecendo qualquer delas. Pela minha parte, obrigada pelo contributo que tens dado à minha.
As usual, sempre um prazer voltar e este cantinho e aprender qualquer coisa.
Toda a sorte do mundo para o Papa Grelos.
Zé,
As usual, sempre um prazer voltar e este cantinho e aprender qualquer coisa.
Toda a sorte do mundo para o Papa Grelos.
Deva, O Papa Grelos (não é vegetariano, tem a ver com outra particularidade da vida que levou) ficou emocionado por nunca pensar que lhe passavam cartão.
São desta pequenas coisas que resultam grandes resultados na transformação de ver a vida de outra forma.
Ele fica agradecido pela força.
Eu também.
Luís Gomes, o mesmo se aplica a si. Sempre com a gentileza de perder o seu próprio tempo com coisas que não podemos ensinar (rs).
Obrigado aos dois.
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