sábado, outubro 07, 2006

Porque hoje é sábado



“Impossível fugir a essa dura realidade.
Neste momento todos os bares estão repletos de homens vazios,
todos os namorados estão de mãos entrelaçadas,
todos os maridos estão funcionando regularmente,
todas as mulheres estão atentas.
Porque hoje é sábado!”

Vinicius de Moraes


No levantar pela manhã ao som estridente dum toque que nos é familiar, sabemos de antemão que hoje é sábado. Um dia da semana em que os advogados estudam processos e ultimam recursos. Um dia em que os juízes estão de folga e os tribunais se encontram encerrados.

Ao contrário de outros estabelecimentos de diversas ramificações comerciais em que a vida pára, uma prisão está sempre aberta. Aberta às visitas, aberta às ideias, renovadamente aberta à mudança da roupa da cama.
Sem dramas, um sábado neste Palacete onde as empregadas domésticas não existem, somos nós que realizamos a manutenção desta casa de família. Provavelmente igual aos mecanismos da própria casa dos que passam por aqui. Ele é o pó, as arrumações, as limpezas às latrinas e celas onde as barras de ferro não se descuram.

Mas ser sábado neste espaço tem vantagens acrescidas. Dá a ideia que as pessoas acordam mais bem dispostas, menos agressivas e com a sensação libertina de quem vai ser posto fora de portas. É o caso do Daniel.
Eram seis da matina,e já estava ele, todo alterado, a olhar para o relógio de parede que tenho no meu apartamento a repetir-se: “- É hoje, mano! É hoje.”

Para quem não lida com situações idênticas, existem sábados que nos ficam gravados. Este é mais um deles, onde nos fica um nó envolto na garganta e não se consegue resistir a uma puta de uma fagulha que nos entrou pelos olhos dentro no olhar d'alegria dele. Na nossa tristeza em volta daquele espaço que por ora está vazio.

Sábado é, e será sempre, um dia bom para se ir viver a vida.

3 Comments:

Blogger peciscas said...

Caro Zé!
Pela mão amiga do Eduardo, vim ter aqui e foi bom.
Faz-nos sempre bem ganhar consciência mais aguda de que, para além do nosso, existem outros sábados.
É positivo que possas dispor deste espaço de liberdade que é a blogosfera. Digo "é" mas deveria dizer "pode ser". Pois, infelizmente, ainda há países em que esta circulação virtual é condicionada e vigiada. E, se calhar, mesmo entre nós e em situações como aquela em que te encontras neste momento, talvez nem sempre seja possível ter acesso a estes espaços.
Virei aqui mais vezes visitar-te e conversar contigo.
E este aqui será sempre "aqui" independentemente do espaço físico onde te encontres.
Um abraço solidário.

5:59 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

só para dar (oferecer) um abraço!

11:26 da tarde  
Blogger Tessa said...

Vivi na Guiné_Bissau, antes e depois de ser independente.
Também senti o mesmo que tu, em relação à libertação do Daniel.
Os meus amigos vinham para Portugal (depois da independência) e nós íamos ficando por lá.
Todas as semanas embarcavam no avião amigos nossos.
Ficávamos com uma grande alegria por eles e pela antecipação da nossa ida.
Mas também ficávamos tão tristes, a pensar que para ali íamos ficando tristes e sós.
Estávamos, também nós, presos.

12:31 da tarde  

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